Na sala de aula

O cinema e a sala: apreciação e leitura fílmica
Prof. Ms Claudemir Ferreira
http://www.artenaescola.org.br/pesquise_artigos_texto.php?id_m=48

O cinema atingiu uma evolução tecnológica altamente sofisticada e se transformou em uma das linguagens de expressão visual mais significativas da cultura contemporânea, definindo-se como a 7ª Arte. Considerado uma das principais invenções científico-culturais, caracteriza-se pelo registro, projeção e ampliação de um conjunto de sons e imagens em movimento.

O cinema, há mais de cem anos, permite ao homem produzir e consumir uma variedade de imagens que servem tanto para entretenimento passivo, quanto para a difusão de idéias, emoções e expressões mais elaboradas. A produção fílmica, inicialmente destinada ao cinema, conquistou um espaço ainda mais significativo com o advento da televisão, do vídeo e da multimídia. Como linguagem de interesse premente de expressiva versatilidade, compreende, além de um corpo de conhecimento notável, mecanismos de interface com outras linguagens, dialogando com várias expressões artísticas: o teatro, a dança, a literatura, a poesia, as HQ, a música, a moda, a fotografia e as artes plásticas. Essa combinação envolve todos os sentidos e amplia ainda mais a materialidade de um filme.

Desde sua invenção, o cinema compreende temas gerais, científicos, filosóficos, históricos, cotidianos, poéticos ou culturais, registrando, por meio da imagem em movimento, todos os tipos de assunto. Não há nenhuma novidade, portanto, em dizer que o cinema, nesse sentido, mais do que um objeto estético com especificidades próprias constitui uma linguagem de formação. Com freqüência, entretanto, é visto de forma superficial e subjetiva, descaracterizando seu potencial como linguagem de conhecimento. Consideramos, portanto, que está em tempo de desenvolver competências para saber ver um filme.
Todo filme requer compreensão como suporte efetivo do pensamento e da reflexão e pode ser utilizado como recurso didático para uma formação mais profunda, reflexiva e crítica.

Ver filmes, entretanto, compreende olhares diferenciados, num processo integrado que parte da perspectiva de que é tão importante sua apreciação quanto sua leitura. Tal apreciação e leitura, entretanto, requer um mínimo de informações acerca de aspectos variados sobre a sua linguagem e sobre os meios utilizados para sua análise. Realizar uma leitura fílmica denota descontruí-lo para reorganizá-lo posteriormente dando-lhe significados antes não percebidos.

A elaboração de um aparato que viabilize procedimentos de apreciação e leitura fílmica é um dos primeiros passos para que essas vivências compartilhadas, principalmente em sala de aula, tornem-se significativas para os alunos.

Uma análise fílmica requer a aproximação de um conjunto de conhecimentos complexos e abrangentes sobre diferentes abordagens analíticas, como também destacam-se as necessidades de conhecimentos prévios sobre a linguagem fílmica, seus gêneros, sua história, técnicas e meios de produção. Nosso objetivo, entretanto, não é formar críticos de cinema com essa proposta, mas desenvolver uma metodologia que facilite, como referido, a apreciação e a leitura de um filme, pois ver um filme de forma significativa é uma atividade como outra qualquer, que se pode apreender e desenvolver.

Inserir, portanto, a apreciação significativa dentro de limites estratégicos, como prática pedagógica, não somente possibilita estabelecer relações entre conteúdos e conhecimentos particulares, mas também amplia o conhecimento do cinema como uma linguagem de arte. Por outro lado, mesmo tendo aproveitamento diversificado, não há uma metodologia pronta. Educar para uma leitura fílmica significa sensibilizar-se, saber sensibilizar, formar o sujeito por meio da experimentação e envolvê-lo em todo processo de ensino-aprendizagem.

Portanto, o cinema ajusta-se como recurso didático, pois se trata de uma linguagem inventiva, uma narrativa composta de uma sucessão de espaço e tempo, circunscrita entre o início e o fim de sua projeção, que comporta temas e conteúdos diversos.

É preciso então que o professor seja mediador e que esteja preparado para explorar um filme colocado à disposição de seus alunos, para que o filme ganhe sentido didático e propicie o aprendizado.

Selecionar um ou outro filme pode ser justificado inicialmente pela temática. O cinema é eminentemente temático e seus conteúdos são ilimitados. Quase tudo já foi filmado, desde os temas mais cotidianos até mesmo históricos, filosóficos, sociais, ideológicos, religiosos, culturais, conceituais, psicológicos. Mas não podemos esquecer que o cinema não é ingênuo, portanto, nosso olhar não deve ser ingênuo. Apreciar e ler um filme significa ler todos os seus elementos tanto objetivos, como subjetivos, e estabelecer e identificar temáticas também requer o exercício, a prática e a vivência com a linguagem do cinema.

Ao tecer uma proposta metodológica utilizando-se da linguagem cinematográfica é necessário levar em conta alguns aspectos: a) O primeiro contato traz entretenimento, impressões e emoções que nascem do espectador em relação ao objeto-filme; analisá-lo não significa suprimir esse momento; b) Analisar um filme implica revê-lo algumas vezes, numa sala de cinema, por meio do vídeo, DVD ou multimídia, pois a memória muitas vezes nos engana; c) A emoção do primeiro contato e a cognição sensata do segundo caracterizam um procedimento emocional elaborado, portanto significativo.

A seguir, apresento uma sugestão de procedimentos didáticos a serem desenvolvidos pelo professor. Nota-se, no entanto, que é um exercício de experimentação e que os procedimentos metodológicos adotados dependerão da disponibilidade de tempo e espaço, conhecimento prévio sobre diversos aspectos relativos à linguagem do cinema, textos de apoio, debates oferecidos, atividades didáticas, redação, repertório cultural, recursos disponíveis e projetos de ação.

A experiência pode seguir, de modo geral, 04 (quatro) etapas, a saber:

a) planejamento e preparação; b) apresentação e exibição; c) debate e reflexão; d) conclusão e verificação.

a) Planejamento e preparação

  • Refere-se ao planejamento e à pesquisa de filmes de interesse geral, que possam ampliar o repertório do grupo ou que complemente conteúdos específicos do curso com objetivos determinados. Os filmes podem abordar qualquer temática e serem suscetíveis de enquadramentos diversos e multidisciplinares, entretanto, sua escolha deverá levar em conta, por meio de sondagem, preferências e adequação de faixa etária do grupo.

  • Ainda na fase de preparação, o professor poderá vivenciar anteriormente a experiência de ver, analisar o filme e buscar possíveis temas a serem discutidos de acordo com seu planejamento ou proposta. A análise poderá compreender a qualidade do material selecionado, um relato síntese de aspectos substanciais que contenha as informações sobre referenciais, personagens, forma, conteúdo, conclusão e críticas realizadas sobre a obra.

    b) Apresentação e exibição

  • Antes da exibição, é importante que o professor informe ao grupo apenas os dados referenciais do filme. Poderá incluir também curiosidades, no entanto, sem atribuir juízo de valores. A critério, poderá fazer observações durante a projeção ou esperar o término do filme. É importante que o professor justifique o uso do filme e que fique atento às reações do grupo durante a exibição.
  • Após a exibição, caso seja necessário, algumas cenas poderão ser reprisadas para que o grupo reveja determinados aspectos antes não observados ou elementos gerais como ações, diálogos, efeitos, expressões, sons, entre outros.

    c) Debate e reflexão

  • O professor poderá inicialmente questionar o grupo sobre o que viu e deixar que o grupo apresente suas observações. Poderá, dependendo do caso, sugerir que o grupo elabore um texto para realizar uma análise mais abrangente.
  • Após ouvir os relatos do grupo, o professor poderá então se posicionar com suas observações destacando convergências e divergências apresentadas. É importante enfatizar que um filme é constituído de uma linguagem própria. O cinema possui elementos específicos que o caracterizam: enquadramentos (planos e angulações), roteiro, sons (diálogos, música e ruídos), fotografia, personagens, direção de arte, entre outros.

    d) Conclusão e verificação

  • O professor poderá realizar uma síntese final, indicando os objetivos da atividade e relacionando-os com o conteúdo desejado; poderá sugerir leituras complementares, filmes que contenham assuntos semelhantes, sites de pesquisa ou desenvolver outras atividades.

    A elaboração de uma análise dos elementos constitutivos da linguagem cinematográfica pode contribuir para uma apreciação significativa, entretanto apontamos aqui apenas um conjunto mínimo de informações.

    Em primeiro lugar, podemos começar pela indicação dos dados referencias que compreendem as informações básicas de identificação de um filme: nome do diretor, país de origem, ano de produção, gênero (mesmo que de forma indicativa), movimento ou escola a que possa ser associado (Neo-realismo, Cinema Novo ou Nouvelle Vague, por exemplo), créditos principais (quem dirigiu, quem elaborou o roteiro, quem são os atores etc.) e sinopse da história. Feito isso, passamos para uma descrição analítica dos personagens que são sujeitos da ação, elementos sobre os quais as ações se desenvolvem e em função da qual a narrativa se organiza. A focalização dos personagens permite uma orientação para adentramos na narrativa: quem são, o que pensam, como se comportam, quais seus objetivos, quais suas principais características etc. A análise pode seguir com o levantamento e as observações a propósito da idéia ou conjunto de idéias que se apresentam no filme, incluindo, por vezes, seus aspectos subjetivos.

    Nesse aspecto, podemos observar o argumento do filme (qual ou quais os assuntos abordados e de que forma), o tema ou os temas (do que trata o filme: amor, vida, guerra, diferenças, preconceito, trabalho), o roteiro (como acontece o desenvolvimento da narrativa), as circunstâncias da história (tempo e espaço). O percurso não pode deixar de evidenciar também a configuração externa do objeto-filme que é caracterizada pelos elementos constitutivos da linguagem cinematográfica: enquadramentos (planos, angulação, movimentos de câmera), a fotografia (iluminação, textura, cor, profundidade de campo), o som (a música, os ruídos e os diálogos), os efeitos visuais (produção de imagens não reais), arte (figurinos, cenografias, maquiagem) e a montagem (organização e colagem de fragmentos fílmicos).

    Finalmente, podemos apresentar a conclusão que compreende a observação final dos tópicos apontados e possíveis convergências com os conteúdos a serem trabalhados.

    Deve-se observar a importância de utilizar o cinema na sala de aula e de repensar os procedimentos utilizados e suas implicações. Seu uso como prática educativa possibilita sensibilizar os alunos e desenvolver novas formas de compreender e ler criticamente os meios eletrônicos e as novas tecnologias de informação. Entretanto, o cinema não deve ser usado apenas como entretenimento ou simples ilustração de conteúdos. O trabalho com o cinema pode converter as aulas em atividades significativas, tangíveis e experimentais.

    O termo sétima arte foi dado por Riccioto Canudo no Manifesto das Sete Artes, em 1911. Essa referência é apenas indicativa, cada uma das artes é caracterizada pelos elementos básicos que formatam sua linguagem e classificadas da seguinte forma: 1. Música (som); 2. Pintura (cor); 3. Escultura (volume);4. Arquitetura (espaço); 5. Literatura (palavra), 6. Coreografia (movimento) e 7. Cinema (integra os elementos das artes anteriores). Parte das idéias de Canudo, possivelmente, estão ultrapassadas, mas o adjetivo dado ainda se mantém.
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